quarta-feira, 10 de novembro de 2010

Relato Santa Bárbara 04.11

Os dias estão cada vez mais quentes, hein pessoal? A cada semana que passa a trilha do Caminho de Areia até a Santa Bárbara é mais penosa e, com o calor, os odores emanados pelo canal e pelo chorume do lixo ficam mais fortes.
Encontrei Maurício na secretaria, separando materiais para a sala de aula, se queixava de um CD que tinha certeza que estava na escola, mas não encontrava de forma alguma. Levou mais alguns minutos reelaborando a atividade do dia e pronto, “Vamo lá?” A atividade consistia em trabalhar ritmo e rima, com a música do Burrinho - Arre Burrinho que vai pra Arremoz, carregadinho de Arroz, Arre Burrinho que vai para o Minho, carregadinho de Cominho, e assim por diante, utilizando lugares de Portugal. A idéia era trabalhar a música localizando lugares da península Itapagipana e, em seguida, fazer as devidas rimas. Chegamos à sala do primeiro ano e Maurício logo perguntou aos alunos ”onde nós moramos?”, “que lugar da nossa cidade conhecemos?!”, as respostas foram várias: Ribeira, Fazenda Coutos, Paripe, Bomfim. É incrível, num primeiro momento quase todos estão dispersos e o professor começa a aula sem grande empolgação por parte dos estudantes, depois de algumas perguntas quase todos estão em pé, frente ao professor, querendo participar também! Após retomar seus lugares, Maurício lhes pergunta como faz um burrinho quando anda. Cada um inventa uma onomatopéia diferente, até imitam o relinchar do Burro. O professor então sugere estalos de língua, um grave e um agudo, para simular o caminhar do burrinho, todos realizam a atividade com sucesso. Maurício começa a cantar a música do burrinho, com os locais de Portugal, no meio ele canta “Arre Burrinho que vai para ... ? Carregadinho de ... ?”. Começa então a colocar espaços vazios na música, para que os alunos possam completar. Tudo vira uma festa, e naturalmente os alunos vão falando locais da cidade, assim como fizeram no começo da aula e a rima fica a cargo da criatividade (que não é pouca!), surgem mil palavras, algumas rimam, outras não.
No quadro, o professor coloca de um lado os locais da península e do outro a rima, fica assim:
Ribeira _________ Ladeira
Uruguai _________ Papai
Bate Estaca ______ Boracha
Jardim Cruzeiro___ Chuveiro
Belamita _________ Carniça
Caminho de Areia __ Poeira
Todos cantam novamente a música do burrinho, mas dessa vez a versão da turma. Para finalizar a aula cantam a música do Leitinho, mas estão muito dispersos, loucos para ir para educação física.
No terceiro C, Maurício já entra na sala pedindo para que organizem as carteiras em fileiras, acho que parte importante do trabalho docente é também instruir para a organização e ordem, sem reminiscências ditatoriais. Para mim, saber viver bem consiste em saber se organizar no tempo e no espaço com sabedoria e segurança. Enquanto os alunos arrumavam as carteiras, Maurício explicava a Géssica e a mim que, por estarmos na reta final do ano, as atividades agora estão todas relacionadas a avaliação, enquanto escrevia as primeiras observações, ouvia o estrondo causado por Maurício, que empurrava o armário de ferro localizado no fundo da sala. Perguntei se precisava de ajuda, rindo, respondeu que sim. Deu-me uma caixa com vários instrumentos pequenos e pediu para que ficasse escondida atrás do armário, tocando os instrumentos enquanto ele fazia perguntas aos alunos. Essa é uma das poucas turmas onde realmente se pode contar com o silêncio em momentos cruciais – como o momento de ouvir atentamente cada instrumento e suas mais sutis nuances. Foi muito divertido! Cada fila era uma equipe, todos concentradíssimos. Maurício perguntava-lhes sobre a duração(curto/longo), altura (fino, grosso), material do instrumento (madeira, ferro, plástico), e nome do instrumento. Eles conseguiram responder várias perguntas corretamente, e os critérios eram rígidos – ao perguntar o nome do instrumento, por exemplo, pandeiro é pandeiro e pandeirola é pandeirola. Ao perceber que ainda faltava a segunda rodada das quatro filas e só restavam dois instrumentos, resolvi experimentar fazer a “ocarina de mão” – com as duas mãos fechadas sobre a boca, tira-se um som parecido com um apito, mas mais grave. A primeira resposta nem precisou de pergunta, prontamente responderam: “é uma flauta!”, acertaram todas as perguntas que Maurício fez, menos o nome do instrumento e o material de que é feito. Na ultima fileira experimentei fazer um groove com a percussão corporal. Acertaram quase tudo, o que mais me chamou a atenção foi o momento que Maurício perguntou: “Quantos sons diferentes ela fez?” e, uma mocinha, muito segura respondeu: “TrÊÊÊêês!! Peito, estalo e palma!!”. Espertíssimos esse meninos!
No terceiro D já é mais difícil fazer esse tipo de atividade, o nível geral de concentração é mais baixo, mas a atividade foi igualmente divertida. Os instrumentos foram divididos pelas fileiras, uma com as pandeirolas, outra com caxixis e cocos, outra com ganzás e outra com chocalhos. No quadro desenha assim:
Caxixi
x
x
Chocalho
x
x
Ganzá
x
x
Coco
x
x
Pandeiro
x
x
Cada espaço com X vale um tempo, espaço sem X é igual a silêncio. Maurício rege a turma, na primeira rodada eles se atrapalham muito, mas a segunda já é bem melhor. Alguns poucos ainda se atrapalham muito, para mantê-los participando da aula, Maurício simplifica o quadro, de forma que cada instrumento toca dois tempos e pára. Treinam duas vezes com regência e uma terceira sem a regência do professor. Acertam quase tudo! “Palmas pra vocês!”, diz Maurício aos alunos. Dois segundos depois, a turma começa a dispersar. Maurício pega o violão e toca “o que é que ta escrito”, todos acompanham com os instrumentos. Ao final da música, o professor faz mais duas rodadas da leitura no quadro e encerra a aula.
No segundo ano, a atividade é relacionada a audição e rítmica. No primeiro momento eles ouvem as músicas e identificam os instrumentos que estão soando, no segundo, escutam a música e tentam andar e tocar as clavas no mesmo da música. As duas atividades são interessantes os olhos dos alunos, mas essa turma hoje estava especialmente dispersa e brigona. Assim que chegamos a sala, vários alunos exibiam suas maquetes, casas e mais casas de todos tipos, isopor, cartolina, palito de picolé, me deu saudade do meu tempo de escola. Algumas casa bem coloridas, outras com 3 andares, até mobília de isopor fizeram! É claro que nem todos tinham levado sua maquete, o que já gerava um ambiente levemente hostil. Entramos na sala e a algazarra era completa. Géssica de um lado tentava separar uma brincadeira-de-briga, e eu de cá tentava fazer com se sentassem nos lugares e fizessem silêncio. Em vão. Maurício assistia tudo de braços cruzados e cenho franzido, encostado no quadro. Depois de alguns minutos desistimos também. A Maurício esperou a turma se acalmar, explicou a atividade do dia e salientou: “Mas se vocês continuarem com essa bagunça não vai dar tempo de fazer tudo”. Dito e feito, ou melhor, não feito. Foi uma aula conturbada, ficou claro que quatro ou cinco alunos eram os grandes causadores da baderna, e o resto acaba acompanhando. Cansativo, pra fechar o dia com chave de ouro e me fazer pensar. Será que o segundo ano é melhor escolha para a prática de ensino ano que vem? A dúvida continua no ar.

Um comentário:

  1. Problemas como esse do segundo ano acontece pelo fato de que os professores não seguem o acordado no período da semana pedagógica, ou seja, só preparam a turma pra aula de música quando chegamos na porta da sala, esses são desafios que vamos encontrar sempre nas escolas.

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