segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Relato Santa Bárbara 14.10 Festa de Dia das Crianças!

Não sei por que não existe a sesta – ou “siesta” como dizem nossos “hermanos” latino-americanos – no Brasil. Pense aí, ao invés de economizar energia com o horário de verão, economizaríamos “en la siesta!”. Sei que depois do almoço me dá uma moleza, um sono. Quinta-feira é o único dia que consigo almoçar em casa, e também é o dia que vou à Santa Bárbara. Aproveito para tirar meu cochilo antes das aulas, definitivamente é revigorante. Acordei 10 minutos antes do toque do despertador, Ricardo me ligava da escola perguntando se compareceria às aulas da tarde, afirmei que sim. Ele: “Baaaaaaaaaaaaala Barral!!! Tá rolando a festa de dia das crianças, eu já fui DJ jáfuiprokaraokêjábrinqueivenhavenhavenhapra cá...”. Bem verdade que só entendi metade do que ele falou, mas a empolgação em sua voz era contagiante! Já havia passado duas semanas sem ir à escola, por motivo de doença. Doença essa que gerou um dos momentos mais emocionantes da minha vida docente: Géssica e eu assistimos as mesmas turmas. Numa das últimas reuniões ela me apareceu com um bolo de cartas enviadas pelos alunos do 2º ano, seis e sete anos. Desejaram melhoras, desenharam uma ambulância, mandaram beijos e palavras de carinho. Fiquei muito comovida, estava morta de saudades dos pequenos e depois da ligação de Ricardo quase explodi de ansiedade!

Cheguei à escola um pouco depois das 13 horas. A festa estava marcada para as 14 horas, mas algumas crianças já aguardavam no portão da escola, quase tão ansiosas quanto eu. Dentro da escola, as gargalhadas das professoras e merendeiras reverberavam pelo espaço vazio, relembravam os episódios cômicos ocorridos durante a festa do turno matutino. Eu: “Boa tarde!”, elas:” Booooa! Olhe, os estagiários de Maurício deram um pau retado aqui de manhã, viu?! Quero ver como vai ser de tarde...”. Sentei-me próxima e comecei a escrever meu relato enquanto ouvia as histórias das professoras, uma delas ainda teria de preparar a sala da massinha de modelar, resolvi ajudar. Enquanto ajeitávamos as tigelas e mesas, ela me contava sobre seus 19 anos ensinando na escola Santa Bárbara, pasmei! Contou que a escola antigamente era estadual e, quando se municipalizou tentaram demiti-la, mas o corpo docente não permitiu. Comecei a me imaginar lecionando 20, 30 anos em um mesmo local, ser professora de gerações e gerações e conseguir manter-me antenada, jovial e sorridente, assim como a Pró Antônia. Saindo da sala encontrei Maurício, ele me mostrou a sala da discoteca e me explicou o que fazer: nada muito complicado, apenas selecionar as músicas no Laptop e colocar a gurizada pra dançar. A escola possui nove salas, cada uma delas foi modificada para virar uma sala especial: karaokê, vídeo, jogos, salão de beleza, discoteca, pintura facial, massinha de modelar entre outros. Na discoteca uma enorme faixa de papel metro lacrava as janelas, tornando o ambiente mais escuro, o Laptop da professora funcionava como pick-up e um amplificador paloso (pode dizer paloso?) de Maurício fazia a festa. Alguns CDs foram dependurados com linha de nylon no teto e viraram a diversão dos alunos, eles pulavam e tentavam alcançar os CDs, resultado: no final da festa já não havia cd no teto.

Portões abertos, uma professora se encarregava da entrada dos alunos (havia um cartão para cada aluno, conforme passavam pelas salas, marcavam lhe o cartão), e eu pela discotecagem. Além dos CDs havia quatro ou cinco músicas que Ricardo baixou do youtube pela manhã, elas de fato foram a salvação da festa: Justin Bieber, Parangolé, Psirico e Fantasmão. Foi um tal de “laaaaarga o pagodão Pró!”, não vou dizer que me senti bem, mas de fato a alegria de dançar com os colegas e amigos mudava o semblante de cada um deles. No começo foi cômico, meninos de um lado, meninas de outro. As meninas, em sua maioria, desinibidas e brincalhonas. Os meninos, em quase totalidade, tímidos. Poucos dançavam e, quando resolviam dançar era algo mais parecido com uma encenação de briga – Salve Chicletão! – do que uma dança realmente, tivemos que acender as luzes e parar o som duas ou três vezes, a briga deixou de ser encenação. As meninas rebolavam com gosto, me perguntei se elas não gostariam de ouvir Kuduro ou outras músicas dançantes de origem africana. Realmente penso que eles gostam tanto do pagode por falta de opção, falta de alternativas várias, ignorância musical e, é claro, suscetibilidade ao bombardeio midiático. Alguns entravam na sala com cara de espanto, outros fazendo pose, de óculos escuros. Chegavam dançando ou tímidos, mas sempre muito empolgados. Muitos não sabiam que eu estava na escola, quando entravam e me enxergavam atrás do Laptop abriam um sorriso largo, e eu de cá respondia com outro sorriso seguido de: “Vem cá p'reu te dar um cheiro!”. Ganhei muitos abraços, e como eles gostam de ser abraçados! É um carinho sem fim. Alguns deles haviam passado na sala de pintura facial antes, saí da escola com a orelha cheia de tinta. Muitos me perguntaram sobre as cartas e a resposta era sempre a mesma: “Li todas, minha flor, e a cada uma que lia me sentia melhor, se não fosse por vocês não sei se estaria aqui hoje!”. Ficavam muito felizes ao saber que seus escritos foram tão importantes. É bom se sentir importante, né?

Tânia chegou à escola no auge da discoteca – que segundo as professoras: “Não bombou tanto não! Tinha que ver de manhã, deu a hora de ir embora e ninguém queria sair!” –, o calor dentro da sala era enorme! Sauna grátis (risos)! Entre uma música e outra, pedidos diversos e sempre a mesma resposta: “Só tem essas músicas!!!”. Eles vinham direto pra cima do Laptop e de mim, em alguns momentos havia mais alunos circundando a DJ do que efetivamente dançando.

Pausa, hora do lanche, salgadinho e suco de laranja pra todo mundo! Por que será que criança gosta tanto de salgadinho? Os nutricionistas deviam se aproveitar disso, criar salgadinhos de rúcula, cenoura, beterraba. Sonho?

A festa acabou um pouco mais cedo e todos professores se reuniram na sala da diretoria, eu fui atrás. A diretora leu uma mensagem muito bonita para os professores, parabenizou cada um deles pelo trabalho bem realizado. Alguns pediram a palavras e descreveram um pouco da sua trajetória e salientaram o quanto é importante o amor pela docência. Fizeram questão de agradecer aos bolsistas do PIBID presentes na escola, agradeceram toda ajuda e nos parabenizaram também. Agradeci em nome de todos os bolsistas. Mauricio pediu a palavra e relatou um pouco do que é dito sobre a escola e os professores nas reuniões gerais, eles por sua vez, também se sentiram lisonjeados. No fim da reunião bolo pra todo mundo. Foi um momento agradável de entrosamento e comunhão. Até ganhei uma caneta!

Fim de festa, peguei uma carona com Maurício até o ponto de ônibus. Conversamos um pouco sobre o artigo que estou escrevendo com Ana Tomich, ele deu várias idéias e norteou a pesquisa. O cansaço e desgaste do dia inteiro eram aparentes. Eu: ”Ah! Mas um cochilo é revigorante, você não acha?!”. Ele: “É com certeza! Aliás, um cochilo é tudo que eu posso ter agora, no máximo cresce para uma soneca, mais que isso é impossível. Daqui a pouco tenho que estar na escola pro terceiro turno”.

O terceiro turno é o SEJA, Segmento de Educação para Jovens e Adultos. É a “menina-dos-olhos” de Maurício. Apesar de todo cansaço e da correria do dia inteiro, em hipótese alguma deixaria de ir à escola acolher seus alunos. É muito amor gente, é muito amor.

3 comentários:

  1. Muito amor mesmo, mas é este amor que nos revigora e nos deixa completamente gratificado e satisfeito! É, sem dúvida, esta troca com os alunos que nos faz aguentar tudo ... inclusive as tantas chatices complementares que fazem parte desta profissão ....
    E já que estamos no papo, aproveito, mesmo com alguns dias de atraso, para dar meus parabéns a vcs e a nós, professores de alma! Como não sou muito fã das datas comemorativas oficiais e impostas ... prefiro assim mesmo ... fora do prazo e por motivos verdadeiros!

    Parabéns, minha gente!

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  2. Fico emocionado ao ler esse relato...
    parabéns para todos nós, e muita força e garra nessa nossa jornada!!!
    Valeu!!!!

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  3. ÊA Barral!!!!!!!!!! Super bonito o seu relatório!!!!
    Esse dia foi muito marcante para mim tambem!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
    Vamos em frente!!!!!!!!

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