quinta-feira, 1 de março de 2012

Volta às aulas: Conceitos e preconceitos...

E lá vou eu em minha segunda visita à Escola Carmelitana ( a primeira foi no ano passado já no final do ano)

As aulas começaram com uma recepção calorosa aos novos alunos, lá eles têm uma música própria para desejar boas vindas e, além de muita animação, era muito engraçado ver o nosso supervisor Davi dando “pulinhos”,“ rodadinhas” e “gritinhos” em meio a toda aquela criançada.

Meu companheiro, Tiago, também estava lá, marmanjão se comportando como uma criança. Naquele momento fiquei meio sem reação e até criticando um pouco aquele comportamento, afinal para mim é muito difícil mergulhar nesse universo infantil. Ao término da recepção, todos os alunos foram para sala e Tiago e eu acompanhamos o professor Davi até a biblioteca da escola. Perguntei a ele se ele não precisou vencer certo preconceito pessoal e ele me respondeu de uma maneira muito inteligente: “Se você pensar que não é um estranho e sim um deles fica mais fácil”, eu já havia perguntado isso para outros colegas que lidavam com crianças, inclusive com a musicalização infantil lá na escola de música, mas nunca tinha ouvido nada tão satisfatório.

Ele estava verificando os últimos toques para a instalação de um televisor e um aparelho de DVD, aumentando assim as utilidades da biblioteca; também estavam lá outros dois membros da coordenação. Vendo aquilo fiquei pensando comigo: “Dizem que faltam recursos para a educação, então deve ter sido muito difícil conseguir verba para comprar esse material; como será que a escola deu importância a existência de uma sala de vídeo?” Então perguntei ao professor Davi, que me respondeu juntamente com uma das coordenadoras de que isso na verdade era fruto de uma equipe atuante dentro da escola, capaz de entender como se processa a política de recursos e administrá-la em conjunto objetivando o bem estar dos alunos “Queremos que os alunos tenham vontade de vir à escola e tenham este lugar como uma verdadeira fonte de motivação”, achei interessante, pois estudei em escola pública por três anos no ensino fundamental e o que mais via era o descaso dos professores quanto à qualidade do ensino e ao bem estar dos alunos, e essa preocupação não se limitava ao professor Davi, fui mandada para a sala de aula para observar o comportamento dos alunos do 5° ano e, antes de começar, a professora me deu uma “ficha” geral e individual da turma, me contando como era a realidade particular de cada um deles, suas dificuldades na escola e na vida particular, além do comportamento de cada um em sala. Queixou-se de não poder dar uma maior assistência para cada um deles, pois também tinha sua vida familiar e pelo seu cansaço, pois há muitos anos se dedica arduamente á profissão. Este último eu também havia percebido pela voz e pela forma de lidar com os meninos, parecia conhecê-los há muito tempo.

No quadro havia um questionário que perguntava desde dados pessoais como nome completo dos pais ou responsáveis até coisas bem subjetivas como “qual é o seu sonho? “Qual sua meta para o 5° ano?”

Apesar das perguntas serem respondidas individualmente, havia uma aluna que praticamente copiou o dever da colega como se fosse o dela, a professora que já conhecia esse comportamento mandou ela me pedir ajuda para fazê-lo. Então, nós apagamos as respostas copiadas, uma por uma, e eu repeti para a menina as perguntas e esclareci dúvidas, o que deu outro formato para a atividade “agora sim ficou legal, quando você copia, ela não fica com sua cara”! Perguntei para a professora: “já que você conhece a realidade dela, me explique o porquê dela não se esforçar para fazer uma atividade tão fácil como essa.” – Deve ser pelos pais darem muita proteção, respondeu e continuou:

-”Muitos deles, quando passo a atividade para casa, não fazem, já mostrei para Davi como é que eles estão”; se queixa; isso me leva a pensar o quanto é importante que o professor seja comprometido com a educação e não apenas com o conteúdo; quem não entende isso, diante do que vi, pensaria: Que é que o professor de música tem a ver com isto?

De volta à biblioteca, vi muitos livros que falavam sobre a mitologia dos Orixás em linguagem infantil, e fiquei surpresa, já que a escola tem o nome católico poderia ter uma implícita intolerância religiosa. Meu supervisor então disse: “Não devemos ver isto como religião mas sim como cultura, ela é a identidade do nosso povo”

O Título do presente relato se define pelo fato de ter havido, em diferentes momentos, preconceitos de várias partes (principalmente da minha, já que eu sou a principal observadora em questão), porém facilmente quebrados e estabelecidos como conceitos que podem (por que não?) se tornarem também preconceitos. O primeiro dia de aula é, e sempre será mágico, por ser formado por elementos que aparecem e desaparecem inexplicavelmente por trás de um truque.Isso o torna único e mitológico.

O final de minha visita foi algo um tanto ecumênico: Um católico descrevendo para uma messiânica uma missa em latim acompanhada por tambores, onde é comparado o sofrimento dos negros ao sofrimento de Cristo. Mais uma vez quebramos preconceitos e estabelecemos o conceito de que nenhuma idéia sobrevive eternamente, como diria os budistas: “tudo passa”...

Um comentário:

  1. Muito legal seu relato Paola. Cheio de reflexões interessantes e profundas.
    A escola pode sim ser melhor aproveitada, só depende de nós enquanto educadores e da participação de toda a comunidade.
    Que todos nós possamos aprender com ela, assim como você relatou seu aprendizado a partir desse choque maravilhoso.

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