Nesse dia, o ônibus atrasou e
quando Alberto e eu chegamos o professor já estava na sala. No quadro, um
repertório com o título de “Sucessos do Momento”. O professor Ednaldo seguia
com uma atividade que consistia em: 4 passos pra frente – palma - estalo de dedos – vira – 4 passos – palma em
cima – palma embaixo (entre as pernas). Descrita assim, a brincadeira não soa
tão interessante quanto realmente é. Falha minha. Prometo descrevê-la melhor a
quem se interessar.
Como costumeiro, os alunos estavam
divididos em dois grupos – estratégia do professor para trabalhar melhor, já
que o número dos alunos é grande e o espaço livre em sala é pequeno. Primeiro
um grupo fez a atividade, depois o outro, enfim. Terminado esse passo, cantaram
uma das músicas do repertório que estava no palco. A canção: Tchu Tcha Tcha.
Sem grandes dificuldades, cantaram. Ao que me parece, todos sabiam a letra.
A aula da 2ª turma do dia, do 3ª
ano, mais afoita, começou com o professor pedindo para que cada um dissesse um “sucesso
do momento”. O objetivo da atividade era fazer um repertório, como o que tinha
no quadro. Julgo essa atividade importante para se saber o que os alunos tem
ouvido. Ednaldo afirmou que uma forma de mantê-los ocupados, para evitar
possíveis conversas e brincadeiras, é pedir também que eles sigam anotando cada
música sugerida. Isso de fato funcionou, não completamente, mas de alguma forma
prendeu a atenção dos alunos. No fim, o repertório não era muito diferente do
da outra turma. E isso não nos era novidade.
Durante a atividade, mais uma
vez, um aluno me chamou a atenção – o mesmo que eu cito no meu post anterior.
Também nessa aula, o professor chamou a atenção desse aluno diversas vezes:
pediu que sentasse, que fizesse silêncio, que mudasse de lugar, que se
afastasse de determinado aluno para evitar brincadeiras e brigas. Enfim. Em
determinado momento, o professor tinha ordenado que ele trocasse de lugar, já
que estava tumultuando a sala. Mais uma vez, ele veio parar ao meu lado.
Sentou, resmungou, fez cara feia. Trazia o caderno e, enquanto resmungava,
tentava copiar o que estava no quadro. Prestei atenção ao que ele escrevia e
perguntei o que resmungava. “Eu queria ir embora daqui”, disse ele. “Você não
gosta da escola”, perguntei. “Não, queria ir pra outra...”, respondeu. A conversa
se seguiu. Olhando o caderno, não conseguia entender bem o que ele escrevia. “Minha
letra é feia, né?”, perguntou me mostrando a folha. De fato, era. Na verdade,
ele me pareceu não ter muita noção de espaçamento – o título do repertório, a
ordem das músicas, tudo muito junto, ininteligível. Ao me perguntar como se
pronunciava uma canção que estava no quadro, veio a confissão: “eu não sei ler”.
“Como, se tu ta copiando as músicas? ta tudo certinho...”, indaguei. “Ah, eu
sei escrever, mas não sei ler...”, disse por fim. Fiquei sem palavras. Tentei
ainda explicar pra ele como se escrevia, soletrar os títulos, em vão – a dificuldade
dele era grande.
Será que está aí algo que nos faz
repensar a questão da indisciplina?
Pede pra esse menino criar algo e vai ver quanta coisa boa vai sair dessa cabeça.
ResponderExcluirDe fato, Ísis! Ao mesmo tempo em que ele se mostra indisciplinado, desatento, se mostra também afetuoso, curioso. Sei que há um mundo inteiro ali dentro, belo, cheio de vida.
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